Igreja Matriz de Russas - 1735 - Foto do Livro Ábum do Jaguaribe |
As primeiras procissões da Igreja Católica têm suas raízes na idade média, ainda sem uma organização ou participação de sacerdotes ou bispos. Eram peregrinos que desordenadamente buscavam por milagres, migalhas e esmolas no centro da fé católica, Roma.
Com
o passar dos tempos, o ordenamento e a evolução do pensamento dentro das
igrejas começaram a se apropriar deste evento. Movidos pela ideia de promoção
da fé, com a conversão de fiéis, foram estimulando o engajamento com promessas
não de cura e salvação, mas de expiação dos pecados. Os significados e dogmas
foram sendo estabelecidos nos ensinamentos e nas leis de normas e condutas
destas sociedades.
Portanto,
agora havia um objetivo claro, uma organização secular que organiza e convoca
seus fiéis a participarem da comemoração de cada dia santo através desta manifestação.
Assim, as procissões ganharam um caráter múltiplo, tanto de homenagem, como de
clamor, de adoração ou agradecimentos, como de arrecadação para a instituição
religiosa.
Séculos
depois
Aqui
na cidade de Russas, por exemplo, temos notícias das primeiras procissões ainda
na primeira metade do século XVIII, quando foram criados as Irmandades de Nossa
Senhora do Rosário dos Pretos e, posteriormente, a Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário dos Brancos. Havia na época essa distinção pela
própria cultura escravagista, embora sempre tenha sido Nossa Senhora do Rosário
considerada protetora dos povos negros e indígenas escravizados.
Foto: Mauro Angeli; Vista parcial da igreja Matriz e da Praça Monsenhor João Lúis. |
Na
segunda metade do século XVIII aparece fortemente outras irmandades religiosas
como é o caso da Irmandade do Santíssimo Sacramento bastante atuante e
responsável por uma das demonstrações de fé que atrairia centenas de romeiros e
moradores de cidades vizinhas pra virem conhecer na sede do Paroquiato
das Russas a apresentação da Semana Santa, chamadas de as Endoenças.
A
documentação transcrita do 1º Livro de Tombo de Russas e pelo
registro das despesas da Irmandade do Santíssimo Sacramento
pode-se constatar o vulto que tinha tal comemoração.[1]
Durante as duas semanas de festas o ponto mais alto das celebrações era o dia
da morte de Jesus, a Sexta-feira da Paixão. São as duas procissões mais tocante
e comoventes pela expressão de fé.
Logo
pela manhã da sexta-feira, começavam as duas principais procissões de Russas,
de um lado da cidade saía a procissão tendo no andor a imagem de Nossa Senhora
das Dores. No outro lado da cidade vinha a procissão dos Irmãos do Santíssimo
Sacramento, que levavam no andor uma imagem de Jesus levando a cruz e toda a
sua paixão na terra.
Para
demostrarem a fé e compartilharem a Dor simbólica deste dia, os Irmãos do
Santíssimo que levavam o andor, aceleravam o passo, ganhando velocidade e
depois caíam de joelhos no chão sem largar o andor de Jesus. Nesse momento,
aparecia uma personagem conhecida por “Verônica”. Era desenrolado um pano
vermelho com o rosto de Cristo, enquanto essa personagem dizia: “Ó vos todos que passais pelo caminho, vêde
se há dor semelhante a minha dor”[2].
A representação das Endoenças terminava, quando essas duas procissões se encontravam ao chegarem na frente da igreja Matriz de Russas. Daí começava a missa cantada – onde os padres e pároco revezavam do altar-mor principal e os outros quatro altares das laterais da matriz.
As
celebrações da Semana Santa nesses moldes (quiçá alguns elementos medievais),
teve sua interrupção somente no início do século 20, quando o Papa Pio XI promoveu
a Reforma Litúrgica de 1925. Hoje a Semana Santa em Russas não tem nenhuma
manifestação de maior vulto. A data é lembrada por poucos, outros tantos só
sabem que é feriado nacional.
[1]
Araújo, Pe. Pedro de Alcântara. “Capital e Santuário: imagens
russano-nordestinas”; Ed. IOCE – 1986. Pág. 118.
[2] Ibidem