Nesse ano de 2023,
quando Russas e os russanos comemoram os seus 222 anos de emancipação
política, gostaria de falar um pouco dessa história que tem algumas
curiosidades. Acredito que é importante para o ensino da História Local que a
gente coloque sempre um vínculo entre a nossa história, a história do Brasil e
a do mundo neste mesmo período estudado.
O bojetivo é passar a ideia de que nós
aqui em Russas e na nossa região estamos inseridos num contexto bem maior, fazendo com que o aluno amplie o seu olhar para a sua própria história. Um
enredo maior, um processo de construção feito em disputas externas e internas,
que influenciaram diretamente no desenrolar da nossa história local. Afinal, a
data de 06 de agosto de 1801 envolve muitos outros eventos do Brasil colônia e na
política da metrópole em Portugal.
Essa história
começa algumas décadas antes da data comemorativa atual.
O ano de 1750 ficou na
história oficial do Brasil e de Portugal como data da chegada à administração
do Estado português de Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês
de Pombal. Título que só recebeu dezenove anos em 1769, ele foi o
responsável pelas reformas que teve consequências diretas no Brasil,
principalmente, depois do grande terremoto que devastou a capital Lisboa em
1755.
Terremoto de 1755 deixou entre 10 mil e 70 mil mortos e destruiu cerca de 85% das construções de Lisboa - Wikimedia Commons Compliado da Página: Aventuras na Históira |
A necessidade de ter mais controle sobre as colônias para angariar recursos se tornou a política de interesse número um de Portugal. Uma dessas medidas na mudança administrativa foi um decreto de criação de Vilas nas regiões de fluxo de produtos a serem taxados, retirando-as do controle absoluto da Igreja. Uma forma de alcançar os pontos mais inacessíveis para um maior controle e arrecadação.
Para a Freguesia da
Ribeira do Jaguaribe veio um decreto para que o vigário conduzisse junto ao
Capitão-mor do Ceará a criação de uma comissão para a eleição de uma câmara. O
protocolo mandava que o vigário fixasse, como de costume, uma cópia do decreto
na porta principal da igreja Matriz. Além de comunicados verbais depois das
missas e nos locais públicos.
O Vigário na época, Manoel da Fonseca Jaime, apenas registrou na ata da paróquia sem usar outros meios de comunicar à população sobre o decreto. Não interessava a nenhuma das forças políticas local e da Capitania nessa emancipação, pois todos os outros cargos que faziam parte da administração da capitania já estavam bem acomodados com seus devidos apadrinhados políticos.
O fato é que naquele
momento os olhos da administração portuguesa estavam voltados principalmente para
os desvios nas recém-descobertas minas de ouro e pedras preciosas das Terras
Gerais, futura Minas Gerais. Não se deu muita atenção a esta região do
sertão cearense. O motivo do Pe. Manoel da Fonseca não querer a
instalação da Vila era a divisão do poder do vigário, logo da Igreja, na
administração desta freguesia.
Uma vez eleita uma câmara
e oficializada a Vila, a Paróquia perderia completamente a administração de
grande parte das riquezas produzidas pelos criadores de gado e movimentação de
mercadorias. Passaria para as mãos do poder temporal, da chamada Câmara dos
bons.
Depois de mais de três
décadas, em 1798, a comunidade russana encabeçada pelo então vigário José
Bernardo Galvão faz uma solicitação oficial e anexa toda a documentação
anterior do processo de elevação ao termo de Vila. A posição favorável da
Província de Pernambuco saiu no dia 16 de maio de 1799, com a documentação
assinada do Termo de Vila, a qual deveria ser denominada como Vila de Santo
Antônio do Ouvidor.
No entanto, mais uma vez
os russanos têm que esperar por mais três anos. A questão é que naquele mesmo
ano de 1799 foi decretada também a criação da Província do Ceará que deixou de
ser apenas uma Capitania anexa à Província de Pernambuco. O ato anulou toda a
documentação já feita pela jurisdição pernambucana.
Finalmente, somente em 06
de agosto de 1801 a Freguesia de Russas recebe os direitos de eleger seus
representantes locais. É erguida a Vila de São Bernardo das Russas e como
símbolo deste poder é erguido o pelourinho na grande área aberta na frente da
Matriz do Rosário. Neste primeiro momento as eleições eram para os seguintes
cargos: 3 vereadores; 01 Capitão das Armas; 01 Juiz Ordinário; 01 Juiz de
Órfãos e 1 Procurador.
Depois de eleitos, os
mesmos nomeavam pessoas para ocupar outros cargos administrativos não eletivos,
como o Chefe de Quarteirão, o Meirinho, o grupamento armado da força pública e
outros cargos daquele antigo modelo de eleições e os protocolos e cargos administrativos
da época.
Vale ressaltar que o
chefe político da Vila era eleito entre os três vereadores que escolhiam entre
si aquele que assumiria o cargo equivalente hoje a prefeito e nem todos os
moradores podiam votar ou ser votado. Esse privilégio só alcançava quem
soubesse ler ou escrever e tivesse uma renda anual de mais de 100.000$00 réis,
além de outras regras que beneficiavam somente os ricos proprietários ou
membros da nobreza.
Assim ficou gravado na
história de Russas o dia 06 de agosto de 1801. O início de uma nova
realidade e novos desafios para a recém criada Vila de São Bernardo das Russas.
Aliás, passar à Vila não era uma questão de um número populacional grande ou de
grandes prédios de alvenaria na sede administrativa. Criar uma Vila era muito
mais um protocolo administrativo para se obter oficialmente um maior
conhecimento e controle das atividades de um local.
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